Tenebre pode ser considerado o filme mais Argeniano da filmografia do diretor. Seu exercício cinematográfico transcede entre cenas chocantes, metalinguísticas e oníricas. E aqui Dario Argento não só retoma algumas de suas técnicas usada em Suspiria (sua obra-prima máxima, das que eu vi até agora), mas também abre espaço para novos aspectos cinematográficos, principalmente a reviravolta da narrativa e os movimentos de câmera. E como se não bastasse, o filme, basicamente, é desenrolado a partir do uso metalingüísco usado pelo diretor: O livro Tenebre. Que seria a inspiração para os assassinatos, que começam após a chegada do autor do livro na Itália, afim de dar entrevistas e divulgar o lançamento do livro.
A câmera na mão de Argento parece um brinquedo ou um jogo no qual a criança usa e abusa. E parece que ao mesmo tempo em que ele está filmando, também está se divertindo. Suas sacadas de filmagem é coisa de gênio. Tanto no aspecto físico (movimentação, cortes e seguimentos) quanto no emocional (esconder o assassino o filme inteiro e só deixar o espectador imaginar). Por isso Tenebre serve tanto para os que apreciam o cinema, quanto para aqueles que só querer assistir a um bom filme de terror.
“Tenebre” trata sobre a perversão humana e seu efeito na sociedade.”
E como eu já havia dito, o filme se desenrola apartir dos assassinatos, que tomavam como referência o assunto tratado no livro. E a forma como o diretor “engana” o espectador é umas das melhores especificações do filme. Sabemos desde o início que há um assassino. e o melhor do filme é nos mostrar todo tipo de desfecho, o que anula totalmente a previsibilidade, jogando a mente do espectador de um lado pro outro. São usadas as cartas, os telefonemas, e até mesmo as mortes pra revirar o nosso entendimento.
Não posso esquecer das oníricas lembranças do personagem com uma mulher semi-nua na praia rodeada de garotos, com um vestido branco e sapatos vermelhos. Novamente essa mesma mulher aparece em outra lembrança sendo esfaqueada. Aparentemente, essas cenas não tem nenhum real motivo para existir. Mas é somente no final que estas cenas mostram alguma importância. Ou melhor, uma grande importância, afim de explicar as ações do assassino. E por incrível que pareça, nenhuma ponta fica solta.
ALERTA DE SPOILLER >>Mais um ponto que prova a diferença do cinema de Argento é a suas sacadas de narrativa. Ao voltar na casa onde viram Cristiano morrer, o rapaz percebe que ele era o assassino, então se ele morreu, outra pessoa tomou o lugar do assassino. Percebe-se isso também pelo fato de as pessoas mais próximas do protagonista estarem morrendo. Inclusive o rapaz, que provavelmente já sabia demais, e o novo assassino, que seria o autor do livro, queria retirá-lo do caminho. Logo após, a morte do assistente. e depois a morte de Jane, que seria uma das grandes escapadas de Argento para levar o espectador a acreditar em outro desfecho. Principalmente em um de seus diálogos onde ela diz que precisa conversar, pois fez coisas erradas que não queria fazer. É, e realmente consegue, tudo passa pela nossa cabeça, menos o real desfecho. >> FIM DO SPOILLER.
O diretor mostra total maestria em causar reviravoltas e deixar o espectador perplexo, tanto na concretização do filme, tanto na experiência aterrorizante. Percebe-se tal maestria ao filmar a morte das lésbicas, por exemplo, onde a câmera gira em torno de toda a casa, e depois se encontra com a vítima. Genial mesmo. Ou então a cena onde de uma forma incrivelmente dançante, a personagem mancha a parede com o jorro de sangue saindo do seu braço. Ou então o ataque do cachorro. Ou então a cena em que o assassino força a vítima a comer as páginas do livro. Tudo no embalo da trilha eletrizante dos Goblins, e no levantar dos créditos finais, para deixar o filme com cara de desfecho perfeito, o que predomina são gritos incessantes misturados com a trilha perfeitamente combinada.
por Andinhu S. de Souza